quinta-feira, setembro 20, 2007

Ordem dos Advogados- II: o porquê de tudo ter que funcionar assim...

"Massificação da Advocacia: As sucessivas direcções da Ordem dos Advogados, em menos de 20 anos, multiplicaram por 5 ou 6 o número de Advogados portugueses. Primeiro (finais dos anos 80), foi para obter uma fatia maior dos fundos comunitários destinados à formação profissional (quantos mais estagiários houvesse, maior seria a fatia recebida pela OA). A partir daí, a formação tradicional que era ministrada pelos patronos tradicinais com base na prática forense deixou de interessar e adoptou-se uma formação de perfil académico e escolástico com base em aulas teóricas. Havia muito dinheiro a ganhar e não se podia desperdiçar essa possibilidade. E então os dirigentes da OA passaram, na sua grande maioria, a professores/formadores, alguns dos quais ainda hoje continuam a sê-lo. Mais tarde, quando os fundos comunitários acabaram, os candidatos à Advocacia passaram a pagar o estágio, porque os dirigentes/formadores não podiam perder os direitos adquiridos. A situação não mudou, pois quantos mais estagiários fossem inscritos, mais dinheiro recebia a OA. Resultado: somos hoje quase 30.000 Advogados (embora cerca de 4.000 tenham a inscrição suspensa). Assim, não há clientes nem «oficiosas» que cheguem para tantos Advogados ou Advogados Estagiários. Há que pedir responsabilidades, pelo menos em época de eleições, quando alguns dos principais responsáveis por esta situação se apresentam como candidatos aos mais altos cargos da OA."

Fonte: Ilustre Dr. António Marinho e Pinto, candidato a Bastonário


"Que o estágio seja vitalício, no que respeita ao constante aprender e à constante mudança do Direito e da advocacia, compreendo e até é de louvar o facto de nos acabarmos por manter "jovens" e "estudantes" durante toda a vida.

O que não posso louvar é que outros interesses se coloquem acima do acesso à advocacia, como os montantes pagos pelos licenciados que queiram ter acesso à advocacia, acabando por não ver nada em troca. O constante aumento do número de advogados acaba por estar envolvido com isso: quantos mais licenciados se inscreverem na OA, mais dinheiro esta última factura. Curioso é que há menos espaço para que estes operem no mercado e tenham uma formação digna, pois se existem tantos advogados estagiários com a obrigação de ter que efectuar x número de diligências, as mesmas terão que ser feitas durante mais tempo, submetendo os estagiários à tortura de estágios não remunerados, onde ainda têm que pagar para trabalhar, e pagando tudo e mais alguma coisa, sem ver praticamente nada em troca: afinal, até mesmo a formação acaba por ter deficiências. Dos 3 formadores que eu tive na OA na 1.ª fase, dois deixam muito a desejar e noutro grupo de formação diferente do meu, uma formadora ficou muito indignada quando foi surpreendida com as notas bastante negativas que recebeu, acabando por dar um sermão aos formandos porque estes foram sinceros.

Devo juntar a tudo isto que para entrar na OA, tenho que pagar 600 euros! Ora, não tenho pais ricos (praticamente só tenho um dos meus progenitores), era bolseiro na Faculdade, onde tinha que auferir uma bolsa de estudo de valor considerável por não ter quaisquer meios para poder pagar os estudos, e agora entro na OA, mas vejo a porta vedada porque já não prestam o apoio que prestavam com o desconto de 250€ para ex-bolseiros da Faculdade de Direito. Tudo isto tem uma explicação: facturar dinheiro a todo o custo, mesmo que se lese gravemente terceiros (neste caso licenciados em Direito). Fazer dinheiro e quase nada dar em troca, é o que interessa!

Ao fim deste tempo todo de inscrição na OA, eu e muitos outros podemos concluir que a advocacia é realmente para uma elite: para a elite de quem teve a sorte de ter pais ricos que possam sustentar o/a filho/a que agora tenta aceder à advocacia. Para os outros, não há a mesma possibilidade, porque simplesmente não interessa alguém que não tenha dinheiro. Ora, estando eu a ser impedido de exercer a actividade que quero (e se calhar tendo mais vocação e conhecimentos que terceiros), só posso concluir que algo de errado se passa por aqui: estágios intermináveis, submissão a diversas provas (como se fosse uma desculpa para obrigar o pobre a pagar sempre mais e mais caso falhe), estágios não remunerados... tudo isto é sobrehumano e só ao alcance de alguns: dos que podem continuar a contribuir com entradas triunfais na "Ordem" (dos Advogados) de 600 euros, e mais umas belas dezenas de euros por cada repetição de exame, e mais x pelo subsídio de almoço que não recebem, e mais y pelas deslocações, e mais z por alguns livros que têm que pagar para aprenderem sozinhos, senão não aprendem em certas formações, etc. É esta a realidade!

Não, não existe a elite dos bons, daqueles que realmente são bons advogados e bons conhecedores de Direito, apesar de a regra ser existirem excelentes profissionais, felizmente. A regra de hoje também passa por sobreviver sem bolsas (porque já não estudamos), sem subsídios (porque não os podemos receber também), e durante um período interminável chamado estágio!

Espero ter já dito o porquê do estágio ser cada vez mais longo."

Este último texto é a minha opinião sobre o assunto e foi escrita no dia de hoje no Fórum da Ordem dos Advogados.

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