quarta-feira, setembro 05, 2007

Haja ambição!

Tomaz Morais, o seleccionador nacional de Raguebi, traçou os objectivos da Selecção Portuguesa para o Mundial. Ei-los:
- Não perder por muitos contra Escócia e Itália;
- Não deixar a Nova Zelândia ganhar por mais de 100 pontos;
- Tentar fazer uma "gracinha" contra a Roménia;
- Tentar fazer um ponto à Nova Zelândia.

Isto é verídico. Não estou a manifestar a minha parte cómica, até porque cómico é coisa que não sou e esta situação não tem graça nenhuma.
Ora, um tipo que traça estes objectivos merece ir ao Mundial? Vamos lá ser os "bôbos da corte" dos outros? Quer dizer que Portugal vai defender mais do que defende habitualmente para tentar perder pelos números acima expostos?! Se fosse Presidente da Federação de Raguebi, despedia Tomaz Morais! Foi bonita e épica a forma como levou Portugal ao Mundial. Somos a única selecção amadora. Mas, já que sabemos das nossas limitações, começando no amadorismo, para quê traçar estes objectivos deprimentes?! Se fosse eu o seleccionador nacional diria pura e simplesmente isto aos meus jogadores: "não se joga para perder por poucos, nem com a obrigação de ganhar. Termos cá chegado já foi histórico. Agora entrem em campo e divirtam-se porque dificilmente teremos oportunidade de nos divertirmos contra selecções desta categoria. Sem pressões, sem quaisquer obrigações a não ser a de nos divertirmos e desfrutarmos do facto de aqui estarmos". E mai'nada!!!

4 comentários:

Luís Rocha disse...

Itália tem selecção de rugby?

Pinokio disse...

És o maior alexandre.

Cidadã P disse...

Bravo!!!

Bernardo Rosmaninho disse...

Olá Alexandre, e deixa-me agradecer, em primeiro lugar, a tua mensagem num recente post do meu blog. Espero que estejas bem. Eu vou recuperando bastante bem.

Quanto ao teu post, creio que, do ponto de vista de um leigo, é compreensível o estranhar destas afirmações. Eu, caso não entendesse ou soubesse nada da realidade da modalidade ou da federação, assumiría uma postura semelhante á tua.

Acontece que sei e entendo. Por isso, um discurso para o público que para ti soa a pouco ambicioso, é apenas e exclusivamente um discurso para o público. Algo que, se vistos os pressupostos subjacentes ao mesmo, até é muito realista. Senão vejamos.

O rugby não é uma modalidade estática ou que permita uma entrega a factores aleatórios de alguma das suas variaveis fulcrais. O que quero dizer com isto?

No rugby não existe anti-jogo, nem existe um momento de sorte ou talento que possa resolver um encontro, é um jogo colectivo, que tem o seu desenvolvimento muito enquadrado e que visa, a nível individual, um aperfeiçoamento de uma função que se encontra definida, pois faz parte de uma organização colectiva que é suportada por uma condição fisíca, técnica e mental, que poderá variar de jogador para jogador, em suma, de equipa para equipa.


- A Escócia e a Itália são nações que têm campeonatos, equipas e jogadores a praticarem um rugby cujo nível é imensamente superior ao nosso. Tanto técnicamente, como tácticamente, como (e esta é mesmo muito importante) fisicamente. Não temos a capacidade física, técnica ou o traquejo para sequer ombrear com eles.

*Porquê? Porque não podemos alterar as variáveis. Não consegues ficar mais rápido, mais talentoso, mais rotinado, mais habituado e mais forte de um dia para o outro. Eles tiveram décadas para evoluir. Décadas. Nós só agora começamos a crescer... Querer sofrer menos de cinquenta pontos deles não é falta de ambição, é saber o que vai acontecer.

- Agora pega naquilo que te disse, e multiplica em termos de gravidade por dois ou três e terás, de uma forma muito realista um vislumbre do que é enfrentar uma equipa como a Nova Zelândia. 15 jogadores oriundos de um país onde o desporto nacional é o rugby. 15 jogadores da equipa mais intensamente preparada na história da modalidade!

*Estes gajos são tão bons que mesmo se jogassem mal, tinham que estar fisicamente nas lonas para nós começarmos a ombrear com eles. Esta é uma equipa que, nos últimos meses andou a enfiar em jogos de teste vários cabazes de 50 pontos à França. E é a França! Imagina Portugal?

- Quanto à Roménia, a conversa é diferente. Trata-se de uma nação ao nosso alcance, sem dúvida. Mas existem diferenças entre o tratamento que estes dois países receberam que tu deves observar.

*A Roménia recebeu 1,5 milhões de € para se preparar para o mundial, Portugal 0,5.
*A Roménia tem um clube a jogar na fase de grupos da Challenge Cup (Taça UEFA do rugby), Portugal nem leva á fase de qualificação uma selecção regional.
*Eles recebem anualmente um apoio três vezes maior que o nosso por parte da AER-FIRA (a UEFA do rugby), apesar de comparativamente, Portugal apresentar melhores resultados nas competições.
*Existe um Centro Nacional de Formação (profissional) na Roménia, para os jogadores jovens ou séniores das selecções. Portugal só com esta direcção da Federação Portuguesa de Rugby é que criou (mesmo sem muitas condições para tal... sim, eles têm condições para isso) o Centro Nacional de Treino, que ainda não produziu atletas profissionais.
*A grande maioria dos atletas séniores de qualidade da Roménia jogam aonde? 1ª e 2ª divisão dos campeonatos de França.
*Assistência média dos jogos da selecção romena: 30 a 40.000 pessoas, da selecção portuguesa: 5 a 7.500 pessoas.

- Resumindo, infelizmente, apesar de os resultados dizerem diferente, é difícil enfrentar (e vencer sempre) uma equipa que é vista pelas federações europeia e mundial como de 2º nível (nós somos de 3º) e que parte sempre com um pé á frente, tendo ainda nos bastidores um grande amigo - a Federação Francesa de Rugby, quando nós amigos, entre as grandes nações (que recebem todas, por participarem no mundial, 15.000.000 de euros - nós recebemos 230.000 - independentemente das classificações finais) não temos nenhum.


Para concluír este texto, que peço desculpa por ser longíssimo, digo-te o seguinte: no rugby não é possível jogar para defender, todos os jogadores de Portugal vão comer (literalmente) a relva e irão dar tudo o que alguma vez sonharam ter no corpo naqueles jogos.

Estarão motivados para isso e nunca baixarão os braços, acredita. Aquilo é o momento da vida deles. Sem qualquer exagero, garanto-te. E se te parece mau ouvir aquilo da boca do treinador então garanto-te que ele nunca precisará de o dizer aos jogadores. Eles sabem-no.

Agora aquele discurso final que tu propões é absolutamente impossível de aplicar nesta modalidade, talvez num encontro de futebol.

O rugby é só sobre pressão, sobre reagires rápido, correctamente e seres agressivo sobre pressão. Sobre pressionares o adversário, todo o jogo. Não tens hipótese de relaxar, não existe a acalmia depois dos nervos.

Disfrutas porque aquilo é algo fantástico e raro, divertes-te porque os teus opositores te dão mais luta do alguma vez sonhaste ter, nem pensas nas obrigações, não tens tempo, porque não podes parar, não podes gerir o teu tempo, tens que dar tudo o que tiveres... e depois ver como te saíste.